#2 Dizem por aí...
(ex-Sugestões de Segunda, a rubrica onde vos sugiro coisas para ver, ler, fazer, ouvir, etc...)
Nota prévia: a minha ideia inicial era enviar estas sugestões sempre à segunda-feira (e daí o nome, bastante óbvio, não é?). Acontece que acho que o dia ideal para partilhar sugestões é a sexta-feira. Porquê? Porque é início de fim-de-semana e se quiseres aproveitar as dicas que vou deixando é mais fácil assim. Posto isto… muda o nome da rubrica e muda o dia de envio. Passamos a encontrar-nos quinzenalmente, à sexta à tarde, ok?
Segunda edição e temos o quê? A sétima arte.
A literatura e o cinema são duas artes cuja relação é peculiar: o cinema não vive sem (boa) escrita; a literatura não precisa de se concretizar em cinema, e - polémica a caminho! - é raro o filme que faz jus ao livro no qual se baseou (estou, obviamente, a falar dos que têm argumentos adaptados).
Se há coisa que amo é estar a ler um livro e conseguir visualizá-lo como se estivesse a ver um filme. Quando digo que o autor X tem uma escrita cinematográfica, na verdade, isso é dos melhores elogios que faço - significa que a sua escrita consegue puxar-me para dentro das cenas e que consegue fazer-me transpor o limite das páginas.
E isto vem a propósito de quê?
De um dos dois filmes que trago hoje como sugestão a não perder (mesmo!).
“The Wife” (“A Mulher”, na versão portuguesa) é das melhores coisas dos últimos anos. O filme é de 2017 e vi-o pouco depois de sair mas revimo-lo em casa no fim-de-semana passado.
Esta é a história de Joseph Castleman, um renomado escritor norte-americano, cuja carreira está repleta de livros de sucesso. Além de escritor, Castleman foi professor universitário de literatura e toda a sua carreira assenta na escrita.
A história começa no dia em que Castleman é informado de que é o vencedor do Nobel da Literatura desse ano. Depois acompanhamos a viagem dele, da mulher, Joan, e do filho mais novo, David, até à Suécia, para a entrega do prémio, e é todo um fervilhar de situações.
Sendo um filme sobre escritores, o meu interesse é ainda mais acirrado. Acontece que (ainda) não li o livro que lhe deu origem, mas quero lê-lo (e vou aproveitar a boleia desta newsletter para o pôr no cimo da minha extensíssima fila de espera) para perceber se o livro é melhor do que o filme. Porque o filme, caro leitor, é genial.
Glenn Glose foi nomeada para nada menos do que trinta e três prémios de melhor actriz pelo papel que aqui representa. Repito: trinta e três nomeações por este papel. Dessas, venceu catorze. Portanto, um papel, catorze prémios de melhor actriz. (Perdeu o Oscar para Olivia Colman, pelo seu papel no “A Favorita”, e isto é coisa que eu nunca hei-de entender, mas adiante.)
Quando vires o filme, repara nas expressões faciais de Glenn Close - é assim que ela representa todo este papel. Há uma cena em particular em que só o olhar dela enche o ecrã e diz tudo o que precisamos de saber. Bastavam aqueles segundos para ela merecer o Oscar assim de caras!
Além de a história ser fenomenal, a representação está soberba. Sente-se a tensão no ar, ouve-se o pó a deslocar-se, tal o gelo que é palpável ali.
Outra senhora que não sabe ser nada abaixo de fenomenal é Dame Helen Mirren.
Neste filme, baseado em factos verídicos - o que, por si só, já é incrível -, ela é Maria, uma judia austríaca que fugiu para os Estados Unidos na altura das invasões nazis. Acontece que Maria era sobrinha de Adele Bloch-Bauer, cujo marido, um riquíssimo empresário e mecenas, pagou a Gustav Klimt (sim, o pintor do famosíssimo “O Beijo”) para que ele pintasse o retrato da sua mulher. Este pedido deu origem a um quadro chamado “Woman in Gold”.
Ora, o que é que os nazis eram muito bons a fazer, além de dizimar pessoas? Expropriar pessoas dos seus bens (sendo que o que eles faziam era basicamente roubar e não expropriar). E foi assim que este quadro (e mais quatro, também de Adele e do marido, Ferdinand) acabaram nas mãos dos nazis durante décadas (na verdade, acabaram estes cinco e mais vastas centenas de outras obras, roubadas a outros judeus, mas foquemo-nos neste quadro em particular).
Só que Maria, já idosa, decide que chegou a altura de reaver o que é seu por direito, uma vez que é a única herdeira da tia. Contrata um jovem advogado, também ele descendente de judeus austríacos que fugiram para os EUA, e começa uma guerra longa e dura, que os fez andar a atravessar o oceano Atlântico para cá e para lá, entre processos na Áustria e nos Estados Unidos.
O filme é uma viagem fantástica entre o passado e o presente (anos 90, vá), os papéis principais foram muito bem entregues (até a Katie Holmes, que tem o talento de uma planta ornamental de plástico, está maravilhosa a fazer de planta ornamental de plástico) e as notas finais são qualquer coisa de avassalador.
Queres uma tarde de chuva bem passada? Vê estes dois filmes. De seguida. Contudo, sugiro que comeces por este…
Um detalhe engraçado, para fechar esta edição: há acasos meio surreais… e estes dois filmes, que vimos na mesma tarde, sem que o tivéssemos programado, e sem que tivéssemos procurado por nada que os pudesse ligar, têm em comum pelo menos três actores. Procura-os por lá… Nós divertimo-nos muito conforme eles foram aparecendo e “ah… espera lá, acho que este entrava no outro filme também…!!”…
adoro the wife - apesar de que dá raiva! o outro não conheço, assistirei!
Acabei de ver o woman in gold
Só pela Dame Helen Mirren e pela Tatiana Maslany já vale a pena! Obrigada pela sugestão