Na semana passada, recebi uma notícia que não esperava. Sem mais nem menos, um amigo de há muitos anos morreu.
As nossas pessoas estão sempre lá, não é? Mesmo que não falemos com elas há imenso tempo, mesmo que a vida nos tenha levado por caminhos diferentes. São as nossas pessoas e são imortais.
O João era uma das minhas pessoas.
Em 2003, comecei a ir ao Templários, em Entrecampos, ver a banda de uns amigos de uns amigos. Aquilo tornou-se um ritual dos sábados à noite.
2004/2005. A vida segue e a banda dos amigos de amigos dá lugar a outra banda. E as pessoas com quem eu costumava ir dão lugar a outras pessoas, conhecidas noutro sítio.
Eu, a Ana Teresa e a Ana Amaro. Conhecidas de discotecas (não por causa das discotecas, mas por causa do meu blogue da altura, A Boneca de Papel). Eu e elas conhecemo-nos no (antigo, nada que ver com o atual) Dock’s e a amizade dura até hoje. Das noites de sexta até às seis da manhã avançámos para as noites de sábado até às 3h e foi ali, no Templários, que conhecemos o João. Miúdo carismático com uma voz incrível, fazia umas versões de Pearl Jam que sempre me fizeram achar que não precisava de ver os Pearl Jam ao vivo - e isto dura até hoje e os Pearl Jam estiveram cá, no NOS Alive, há menos de um mês, e eu continuo a não sentir a mínima necessidade de os ver ao vivo. Música vai, música vem e o João tornou-se amigo.
Em 2006/2007, estava ele a pensar um projeto como cant’autor (como é que se escreve isto??), embarcámos numa viagem engraçada. Eu já sonhava com a escrita a sério. E ele desafiou-me a escrever uma letra para ele. Combinámos uma noite de brainstorming: num estacionamento na praia de Carcavelos, num dia gélido de inverno, maturámos a ideia dentro do carro vermelho dele (não sei que carro era, sei que era vermelho). Nesse serão, apenas alimentados por sonhos e por cigarros, nasceu a ideia daquela letra.
Ele musicou aquilo e, mesmo sabendo que seria preciso um gigantesco golpe de sorte (que nunca aconteceu) para aquilo voar alto, a verdade é que acho que ficámos os dois felizes com o resultado daquela canção.
Depois, a vida levou-nos por caminhos diferentes.
Em 2007, engravidei da minha filha e deixei de ir ao Templários. Acabei por só ver o João tocar mais uma ou duas vezes. Mas o João estava sempre lá. Era aquela pessoa que ia vendo nas redes, certa de que o tempo vai passando mas de que estamos sempre aqui.
Até não estarmos.
Esta semana, o João deixou de estar. E eu não consegui processar o choque. Quando a Ana Teresa me mandou mensagem, percebi imediatamente, mas isso não basta. Quem? O quê? Onde? Como? Quando? Porquê?
Demasiadas perguntas.
Ontem, foi o velório do João, que morreu de repente enquanto estava de férias. E eu tinha dito à Ana Teresa que ia lá ter com ela. E não fui capaz de ir. Porque o João está sempre ali. Com a voz igual à do Eddie Vedder. Com a melhor versão do The Blower’s Daughter de sempre (melhor do que a versão original), com as melhores versões de Muse.
O João.
Leve, complexo, inteiro, atormentado. O João. O nosso João.
E eu não fui capaz de me ir despedir porque começam a doer-me estas janelas que se fecham, as minhas pessoas que vão embora antes do tempo, a certeza de que somos finitos, agora estamos e depois já não vamos estar.
O João.
O nosso João.
[E eu não fui capaz.]
Sinto por sua perda. Que João more pra sempre no seu coração.
Sinto muito... Um abraço gigante!