O Dia Internacional da Mulher continua a ser necessário e pertinente. Continuamos a esbarrar em desigualdades, em dificuldades e em disparates vários, todos os dias. A sociedade está longe de entender que não é um “nós contra eles”, mas sim um “nós, todos juntos, a mudar o mundo para melhor, para que todos tenhamos acesso às mesmas coisas, aos mesmos direitos e aos mesmos deveres”.
Escolhi trazer-vos onze livros que falam sobre mulheres incríveis, cada um à sua maneira e cada um pela sua razão. Curiosamente (ou nem por isso!), foram todos escritos por mulheres.
Para mim, estes onze são todos dignos de leitura e partilha, e encheram-me o coração por vários motivos (e nem sempre falam de mulheres com final feliz…).
[Homens que estão a ler esta newsletter: no final, há um parágrafo - muito relevante - dedicado exclusivamente a vocês…]
Eu sei que sou muito suspeita, mas este livro é qualquer coisa de fenomenal. E não, não fala de uma mulher perfeita, nem há nenhuma personagem sequer perto disso. E é exatamente isso que faz deste Cleópatra & Frankenstein um livro tão bom. Estão aqui relações humanas reais: mágoas, diferenças, desejos, quedas, ruturas, recomeços e uma busca profunda pela cura de várias coisas menos boas. Este livro fala de pessoas imperfeitas que tentam sobreviver entre imperfeições, enquanto vivem relações também elas imperfeitas. Como na vida real.
Esta saga familiar acompanha os irmãos Danny e Maeve Conroy ao longo de cinco décadas. É a história deles, irmãos a quem a vida tira tudo exceto a relação que partilham, das lutas deles para encontrarem o que resta de si mesmos depois de perderem o que era mais valioso para eles: a vida que sempre conheceram, a casa onde cresceram e a noção de quem são e de quem querem ser.
A forma como Ann Patchett transforma a Casa Holandesa numa personagem é magistral, e a maneira como nos faz sentir aquelas angústias todas é inesquecível. De novo, não é uma história sobre coisas perfeitas, longe disso, mas é uma história sobre resiliência e salvação. Amei TUDO neste livro, e nunca me cansarei de o aconselhar.
Canção Doce foi a minha estreia na literatura de Leila Slimani (e quero muito ler O País dos Outros e Vejam Como Dançamos, também eles sobre uma mulher a quem a vida atira desafios intensos).
Este livro acompanha Louise, a ama que é criteriosamente escolhida pelo casal Myriam e Paul para tomar conta dos seus filhos, Mila e Adam, quando Myriam regressa ao trabalho, após algum tempo dedicado em exclusivo à maternidade.
Terei lido poucas coisas tão cruas como este livro, que explora de forma cirúrgica o quão doentias as pessoas podem ser. A escrita de Slimani é sublime, cheia de camadas e, para mim, o único ponto menos bom deste livro é ser tão pequeno.
Já falei deste livro noutra newsletter e devo ter dito que não me cansaria de o recomendar. Como vês, não te enganei!
N’O Palácio de Papel, a ação decorre em 24 horas, mas vamos, capítulo a capítulo, conhecendo a história antecedente deste trio de personagens: Elle, o marido, Peter, e Jonas, o melhor amigo que assume um papel cada vez mais preponderante na vida de Elle.
A maneira como toda a história está construída faz com que conheçamos a fundo estas pessoas. E o fim… o fim é o meu tipo de fim preferido… Pontos extra para os diálogos e para a mãe de Elle, que é assim um rebuçado no meio desta trama!
Mais um livro de que já falámos antes. Li-o no ano passado e, até hoje, esta Elizabeth Zott tem o meu coração. É daqueles livros que se leem mesmo bem, que nos dão vontade de abraçar personagens e onde nos sentimos aconchegados. Fala precisamente da luta de uma mulher para poder fazer o mesmo que os homens, numa época em que as mulheres claramente não podiam fazer o mesmo que os homens. Se queres ler um livro cheio de personagens “badass”, Lições de Química é para ti!
A Cidade das Mulheres apanhou-me completamente de surpresa quando o li. Digamos que não esperava grande coisa da autora do bestseller “Comer, Orar, Amar” (porque sou zero shanti-shanti e tenho muito pouca paciência para o discurso pseudo-inspirador). Estava, obviamente, enganada.
Este livro foi uma delícia, para mim. Estamos de novo numa época em que as mulheres podem muito pouco, mas estamos também perante um grupo de mulheres que quer muito ser livre, fazer o que quiser, quando quiser, como quiser, com quem quiser. A encabeçar a lista de destemidas está Vivian, que chega a Nova Iorque com um sonho para cumprir e que rapidamente perceberá que nem tudo é a maravilha que ela espera.
Sou absolutamente fascinada pelo Médio Oriente, Khaled Hosseini é um dos meus autores preferidos (se nunca leste nada dele, por favor, lê!), e este livro, escrito por uma descendente de afegãos, médica, tal como Hosseini, despertou-me curiosidade assim que o vi.
Aqui acompanhamos a história de Rahima e Shekiba, neta e avó, que se debatem com as mesmas dificuldades com quase um século de distância entre elas. O Afeganistão é sempre aquele cenário cheio de gatilhos, onde a guerra e os talibã tolhem em absoluto qualquer visão que se possa tentar ter do país. A estas mulheres cabe tentarem romper convenções e existirem para lá da sua condição de mulheres. É horrível perceber que ainda há tanto a fazer, mas foi maravilhoso ler esta história sobre os caminhos acidentados de duas verdadeiras lutadoras.
E do Afeganistão vamos até ao Brasil, para conhecermos Eurídice Gusmão, uma mulher igual às outras, no Rio de Janeiro dos anos 1920, onde o que se esperava de uma mulher era que fosse boa esposa, boa mãe, boa filha e que soubesse estar calada. Pois… adivinha quem é que não é nada assim? Exato. Eurídice Gusmão.
A sua irmã sai de casa, porque decide fugir, e Eurídice também sai de casa, mas porque decide casar. Nenhuma é feliz e tentam, cada uma à sua maneira, contornar as dificuldades e viver o melhor que podem.
Amei tanto, tanto este livro que agora que vim aqui falar nele estou cheia de vontade de o reler…
Continuamos no Brasil, avançamos quase cem anos e conhecemos Júlia, arquiteta de sucesso que trabalha num dos escritórios de arquitetura contratados para desenhar os projetos megalómanos dos Jogos Olímpicos.
Um dia, Júlia decide ir correr em direção ao miradouro da Vista Chinesa, no porque natural da Tijuca, e, a meio do percurso, é parada por um homem que lhe aponta uma arma à cabeça e a viola. O livro acompanha os estilhaços que ficam desse acontecimento horrível e a forma como Júlia tenta sobreviver ao trauma.
Bem sei que este tema pode ser altamente controverso e difícil, e é exatamente por isso que considero este livro muito, muito importante.
Era impossível escrever uma newsletter sobre livros com personagens femininas incríveis e não falar deste Cai a Noite em Caracas.
Esta é a história de Adelaida que, no caos que é a Venezuela corrompida e gerida a toque de violência, só quer sobreviver. Para isso, terá de repensar valores e até onde está disposta a ir. É o verdadeiro matar ou morrer, a luta pela sobrevivência que a obriga a dizer adeus à moral e a fazer o melhor que pode com o quase nada que lhe resta.
Karina Sainz Borgo tem uma escrita inteligentíssima, sem artifícios, e é capaz de descrever com a maior crueza as coisas mais cruéis.
Fecho esta lista com chave de ouro: o fenomenal Terra Americana, que me fez chorar e ir abraçar os meus filhos sem vontade nenhuma de os largar e agradecendo muito por vivermos em Portugal e não no México.
Portanto, temos Lydia e Luca, únicos sobreviventes de um massacre perpetrado por um cartel em jeito de vingança. Para salvar o filho, Lydia faz tudo o que se possa imaginar. O livro é tão duro, tão cruel e, ao mesmo tempo, tão cheio de amor que dói. E é mesmo para doer. Tem uma das cenas mais viscerais que já li (a par com outra cena, igualmente dolorosa, do Perguntem a Sarah Gross, de João Pinto Coelho).
É daquelas leituras imperdíveis para quem gosta de histórias bem contadas, apesar de dolorosas. Aconselho muito, muito, muito!
Tenho a certeza de que há muitos mais livros sobre mulheres fenomenais que merecem ser lidos. Se leste algum assim que eu não tenha listado aqui, por favor, deixa-o nos comentários! Quero saber o que poderei andar a perder!
[Homens que estão a ler esta newsletter: mais do que flores, as mulheres das vossas vidas querem ser vistas, ouvidas e entendidas. Se querem oferecer um presente em jeito de “valorizo muito o papel que tens na minha vida”, ofereçam livros em vez de flores. As flores murcham e morrem; as palavras e as histórias, não.]
De repente lembrei-me de uns livros já com alguns anos, que abordam a luta das mulheres por direitos básicos: "Queimada viva", "Lágrimas de Darfur".