4 de fevereiro de 2017
Fez ontem sete anos que escrevi a palavra “Fim” no meu livro.
Obviamente, isto não foi o fim. Depois disso, houve muita edição, reescrita, correção, etc. Mas no dia 4 de fevereiro, uma semana antes do meu deadline, consegui fechar a história e dar a primeira versão do meu manuscrito por concluída.
Depois
Releitura, edição caseira, preparação do manuscrito para o submeter ao Prémio Leya. Esperar pelos resultados. Oito meses de silêncio.
Depois
Seleção de editoras, envio do manuscrito, esperar pelos resultados. Alguns meses de silêncio.
Depois
O primeiro sim, recebido numa tarde de setembro. O grito, a felicidade absoluta.
Depois
Iniciar o processo de revisão com a editora. Receber o texto passado para uma versão com Acordo Ortográfico (que só adotei muito tempo depois, graças ao trabalho como revisora). Não receber nenhuma indicação de edição literária. Debater capas, começar a pensar no design.
Depois
Covid. Contrato cancelado. Lágrimas e a tristeza mais profunda por ver o sonho perder o chão.
Depois
A minha editora, Manuscrito. A Cátia e a Marta. Enviar o manuscrito. Esperar. Não ter de esperar muito: duas semanas entre enviar o texto e receber o «Sim». Olhos muito, muito atentos aos detalhes. O melhor acompanhamento para melhorar o texto. Reescrever. Aguardar pela revisão linguística, pela mão da Ana Cristina Câmara, que foi fundamental no processo. Debater a capa. Fechar a ideia. Ficar maravilhada com o meu nome ali, a concretização do sonho de dar ao mundo as minhas histórias.
Depois
Março de 2021. Na semana em que as livrarias reabriram, o meu livro estava lá. Não tive uma sessão de lançamento presencial, mas autografei centenas de livros em casa. Enviei tudo por correio. Continuaram a chegar pedidos.
Depois
Setembro, 2021. Feira do Livro de Lisboa e eu lá, do lado de dentro da mesa. Uma fila de pessoas à minha frente. Não as conhecia todas, mas estavam ali pelo meu livro. E o meu ar foi de espanto perante isto: há pessoas a ler o meu livro!
Depois
Segunda edição em 2022. E o livro a caminho do Brasil. Como assim, Brasil? A Imã Editorial cruzou-se algures com o meu livro e quis comprá-lo. O livro saiu lá em abril de 2023 e eu incrédula.
Depois
Terceira edição no final de 2023. Completamente inesperada para mim, que nunca imaginei que o meu livro chegasse tão longe.
Depois
Continuo a cruzar-me aqui e ali com pessoas que estão a ler, que acabaram de ler, que vão ler a seguir. Num mercado onde os livros têm uma vida muito curta, a vida do meu está a ser tremendamente longa. E ainda bem.
Mas depois
Nunca imaginei que, sete anos depois, ainda não tivesse o segundo livro escrito. Mas não tenho. Está em processo. Estou a avançar ao ritmo a que a vida me permite escrever. Tenho aproveitado algumas pequenas janelas diárias para escrever. Agora, por exemplo, estou sentada numa Padaria Portuguesa, perto do trabalho. É hora de almoço, comi num instante e vim para aqui escrever um bocadinho. Acontece que senti necessidade, no início do ano, de criar uma conta de email para onde enviar as newsletters que subscrevi e que quero ler com calma, sem as perder no meio de uma avalanche de newsletters comerciais que não me interessam minimamente. E, há pouco, deparei-me com um texto que me fez querer escrever este. Por isso, parei a escrita do livro por uns minutos e aqui estamos. Mas a verdade é que tenho avançado no texto e, agora que descobri exatamente o que aconteceu nesta história, estou pronta para dedicar mais e mais horas ao desfiar de carateres que trará aquelas vidas cá para fora.
O que ando a ler
Já se sabe que tenho uma relação de amor profundo e fiel com os livros da Alfaguara. É raro o livro que sai nesta chancela que eu não quero sugar de imediato. E assim que vi o Três Mulheres na Cidade soube que tinha de o ler. Portanto, quando o recebi, vindo da editora, foi via verde para a leitura.
A escrita faz-me lembrar a da Karina Sainz Borgo. A violência, o cerco a apertar, o sufoco. Está tudo lá. Não é um livro fácil, nem está a ser um livro bonito - no sentido de ter uma história feliz. Porque é um livro sobre violência, solidão, maus-tratos, abandonos e conflitos vários.
Acompanha a história de três mulheres que vivem no mesmo prédio, em Madrid. Oliva é paginadora e vive uma relação muito, muito tóxica e abusiva com um namorado a quem apetece matar a cada página. Damaris é colombiana e emigrou para Espanha em busca de um trabalho que lhe permitisse mandar dinheiro para os filhos que ficaram para trás. Trabalha como ama de dois miúdos gémeos e a forma como é tratada pela família que a emprega está longe de ser ok. Por fim, Horía é marroquina e está em Espanha para trabalhar na apanha de morangos. Obviamente, estando no país ilegalmente tem a vida ainda mais dificultada. Também ela quer juntar dinheiro para mandar para a mãe e para o filho, que continuam em Marrocos. Mas, a dada altura, perde o rasto ao filho e, na tentativa de o encontrar, acaba por se meter por caminhos apertados.
Ao longo do livro há sempre uma violência latente, como se sentíssemos uma mão a apertar-nos o pescoço. Há partes realmente difíceis porque são demasiado reais. Há mulheres que sofrem o que estas mulheres sofrem, e estão ao nosso lado, todos os dias, anónimas no meio de tantas vidas. Isto tem tanto de verdadeiro como de assustador.
Estou a trinta páginas do fim e tenho a certeza de que tão depressa não me vou esquecer destas mulheres. E acho mesmo que é uma história que tem de ser lida, porque há tantas histórias assim por aí…
O que ando a ver
Um Pesadelo Americano, Netflix
Este documentário conta a história de Denise Huskins e do agora marido, na altura namorado, Aaron Quinn.
Em 2015, Denise foi raptada e depois libertada. Acontece que a polícia achou que ela tinha encenado tudo. O filme Gone Girl (realizado pelo David Fincher e com o Ben Affleck e a Rosamund Pike a encabeçar o cartaz) tinha saído há pouco tempo e os investigadores pensaram que ela tinha orquestrado uma coisa do género. Erro crasso…
O que ando a ouvir
Depois de ter pedido, no Instagram, indicações de bons podcasts, a verdade é que o difícil tem sido escolher. Recebi cerca de 50 nomes de podcasts que quero explorar. Este foi o primeiro. São episódios muito curtinhos, que tenho ouvido no comboio, à razão de um ou dois por dia. Não inventa a roda, mas sabe bem relembrar. Cada episódio tem uma dica de organização e gestão de tempo e, não sendo nada absolutamente inovador, é uma visão fresca sobre o assunto. E como são episódios mesmo curtos, sem sequência, sinto que posso ouvir os que quiser, quando quiser.
Obrigada por estares aí!
Muitos Parabéns! (tenho o livro porque o título me atraiu mas ainda não o li)
Li-o no final do ano passado e só firmou a admiração que sentia pelo teu trabalho e pela tua escrita. Acredita que o teu percurso inspira e incentiva pessoas como eu, mulheres como eu, à espera de uma oportunidade do mercado editorial tradicional — por isso: obrigada e parabéns!